Assiste-se, em vários países europeus, ao lançamento de aplicações móveis de âmbito nacional que têm o intuito de rastrear as cadeias de transmissão da doença COVID-19, assim alegadamente contribuindo para a identificação das mesmas enquanto forma de contenção da doença. Em simultâneo, tal origina um conjunto de preocupações aos cidadãos sobretudo no âmbito da privacidade e protecção de dados pessoais, como já havíamos versado aqui.
Portugal não é excepção, pelo que a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) já foi chamada a pronunciar-se, no âmbito de uma avaliação de impacto sobre a protecção de dados ao abrigo do RGPD em relação ao sistema STAYAWAY COVID que não se assume como de rastreio da propagação da COVID-19, mas sim de notificação da exposição individual a factores de contágio, através da utilização voluntária de uma aplicação para dispositivos móveis pessoais.
Esta avaliação de impacto é legalmente exigida, uma vez que a referida aplicação tem por base a realização de tratamento de dados pessoais de saúde em larga escala, nos termos dos artigos 4.º, alíneas 1), 2), 5) e 15) e 35.º, n.º 3, do RGPD.
Em que consiste o STAYAWAY COVID?
Conforme já havia sido noticiado pela comunicação social, a aplicação foi desenvolvida pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESCTEC) em parceria com o Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, e foi analisada pelo Centro Nacional de Cibersegurança e pela CNPD.
Isto porquanto é pretendido que esta aplicação móvel seja colocada ao dispor do Estado, possibilitando-o alertar um utilizador que tenha estado em contacto de proximidade com outros utilizadores da aplicação a quem tenha sido diagnosticada a doença.
Deste modo, na medida em que a utilização desta aplicação implicará um tratamento tendencialmente massivo de dados pessoais dos cidadãos, a CNPD veio emitir a este respeito, no passado dia 29 de Junho de 2020, a deliberação 2020/277 (que pode ser consultada aqui).
Concretamente, o STAYAWAY COVID é um sistema digital de rastreio de proximidade (contact tracing) a ser disponibilizado para telemóveis com o sistema operativo iOS ou Android que utiliza o Bluetooth de baixo consumo energético (Bluetooth Low Energy – BLE) para informar um utilizador da aplicação que o seu dispositivo móvel esteve a uma distância inferior a 2 metros, durante mais do que 15 minutos, do dispositivo de outro utilizador da aplicação a quem foi posteriormente diagnosticado COVID-19, assim alertando para o risco de ter havido contágio, pela proximidade física e duração do contacto, e para o modo de proceder de seguida.
A utilização desta aplicação não requer qualquer registo ou conta e não utiliza dados de localização.
Ademais, está previsto que a aplicação vá dispor de uma funcionalidade de Remote Switch, por forma a permitir ao utilizador que suspenda provisoriamente o funcionamento do sistema.
Está igualmente previsto, aquando do final da pandemia, a descontinuação do sistema e o consequente apagamento de todos os dados.
Na sua análise, a CNPD destacou, então, os seguintes principais aspectos positivos da STAYAWAY COVID:
Por outro lado, a CNPD identificou que a dependência face aos sistemas operativos disponibilizados pela Google e pela Apple consiste num dos aspectos críticos da aplicação, pois tal significa que há uma parte crucial da respectiva execução que não é controlada nem pelos autores do sistema, nem pelos responsáveis pelo tratamento.
Assim, a CNPD alerta no sentido de que os sistemas operativos podem ser unilateralmente alterados pelas empresas, sem que se possam identificar o respectivo impacto nos direitos dos utilizadores. Pense-se, em especial, no princípio da transparência, segundo o qual os titulares dos dados deverão a todo o tempo estar cientes do funcionamento da aplicação e das respectivas implicações no tratamento dos seus dados pessoais e privacidade, mantendo o controlo sobre os seus dados, mormente quando se trata de interacções automáticas.
Ademais, a CNPD entendeu que a avaliação de impacto deverá ser revista, tendo em consideração outros aspectos que não foram analisados, nomeadamente a finalidade e as condições de tratamento dos dados, devendo ainda atender-se a outras recomendações feitas.
Finalmente, a CNPD também recomendou que: